Friday, April 29, 2011

The severed garden

O dia nasceu cinzento apesar de o Sol iluminar a cidade. O dia nasceu cinzento, irremediavelmente cinzento, tem de existir harmonia entre o ego dele e o resto do mundo. Apesar do calor, apertou o casaco negro contra o peito, o preto era lhe confortavel e não sentia nem frio nem calor, sentia apenas a necessidade de apertar o preto contra o peito. Aquecer o gelo que lhe corria nas veias.
Passou o portão, sempre num passo lento e firme, a tristeza tem às vezes este sorriso. O choro alto e claustrofóbico de uma mulher incomodou-o, havia uma fracçao de uma inocente ignorância na forma como estava desesperada. No choro longo e sofrido, ouvia-se uma falta de espirito, uma observação dele demasiado crua, talvez. Mas ele ouvia essa falta de resistência , essa entrega fraca à morte. E continuou a caminhar, estava à tua procura. A dor dele pertencia-lhe, a não desejava partilhar com o mundo.
Algum tempo depois, encontrou-te. Sentou-se à tua frente, calmo e sereno, o rosto impassivel, impenetravel. Do bolso retiou o maço de tabaco, acendeu um cigarro. Deixou que o fumo fosse na tua direcçao. Uma multidão vestida de negro passou por ele, amaldiçoou-o , gritou-lhe. Não entendiam.
Conversou contigo, fez-te perguntas. Respondeste-lhe nessa tua voz grave e despreocupada. Tu és a única pessoa que não tem uma consciência profunda do que te aconteceu e , ele, percebeu tudo demasiado tarde. Era um destino demasiado triste que tentou evitar como pode. Ignorou esse destino certo teu até que se tornou verdade.


O homem acabou o seu trabalho de alisar a terra. Estava habituado aquele ambiente negro e triste do cemitério, estava habtiuado à dor das familias que deixavam naquele sitio o que restava de uma esperança cruel. O homem trabalhava no cemitério há muitos, muitos anos, mas nunca tinha visto nada como aquilo. Um homem novo, com um casaco negro preso ao peito, sentado à frente de uma terra por preencher a fumar.A ignorar todo o ambiente que o circundava. A indiferença dele era a expressao fisica da dor , uma dor ornamentada com uma dignidade respeitavel. Ele estava bem, estava triste. Nada podia ser feito por ele, a morte é irreversivel. So não compreendia , o pedaço de terra na sua frente , não tinha nenhuma campa.

Algum tempo depois levantou-se. Olhou-te uma ultima vez. Pediu-te desculpa, não ia regressar tao depressa. Tambem ele necessitava da doce solidão. Precisava que a tristeza se ajeitasse, que se tornasse artistica.
Tirou o casaco negro do corpo, começou a sentir o calor a ajeitar-se na pele. Tinha uma bruta consciencia ele, queria dizer-te para aliviar o pensamento que estava preso à mente dele. Que lhe era inato. Por isso é que te disse que preferia que o teu suícidio tivesse sido físico, preferia que tivesses como tecto aquele pedaço de terra. Porque morreste quando deixaste de existir, e, completamente morto estás hoje. Seria mais facil se te pudesse chorar naquele sitio. Seria mais facil ver o corpo inerte do seu irmao ao lado de tantos outros.
Mas escolheste um destino ainda mais triste, a arte da tua tristeza foi ainda mais profunda. Arruinas-te um pedaço do ego dele com essa tua morte.

Monday, April 25, 2011

Berlim

Havia um encanto diferente naquela cidade, talvez fosse apenas o meu ego à procura de uma textura diferente para o coração. Mas nenhuma me deixou uma melancolia tao embaladora quanto aquela.

A minha mente prende ao peito a memoria para que a cidade nao morra em mim com a sua vida citadina e calma, aquela boemia e pacífica forma de existir. Os edificios destruídos como recordação de uma guerra; os inovadores e novos que foram construídos e que escondem a ruína fantasma de uma época obscura sem a silenciar. Os jardins que eram bosques com as àrvores grandes e tristes. O povo tao diferente do meu, a diferença exibida pela aparencia exterior.

Há um encanto diferente naquela cidade, nenhuma me deixou tanta melancolia. Ajeitava-se perfeitamente ao meu ego, guardava-me um lugar como a minha cidade nunca guardou ( e, agora, depois da minha traição, guarda-me menos que nada). Há uma sincronização uníssona que aínda hoje torna a noite fresca com aroma a uma suave saudade. E, mesmo depois dos outros sitios que os meus olhos memorizaram, é aquela cidade que o ego vê. Sempre.

Porque a diferença estava no meu ego e , numa nao existente feliz coincidência, encontrou naquela cidade tudo o que desejava ser. Aquela cidade é o meu reflexo, o que também desejei ser.

E, agora, a minha essência tem aquelas cores, nenhuma a iguala. Ou atenua a saudade.

Thursday, April 21, 2011

Cores de Paris

Talvez se tenham esgotado as palavras, às tantas ele pintava o seu proprio defice na realidade. Talvez desenhasse tudo o que o nao compreendia e tudo o que ele nao compreendia. Talvez a arte tenha sido uma forma de enquadrar a tristeza na filosofia que sempre acreditou: a arte é inutil, sem proposito, metaforica e bem fundamentada. Garante um certo optimismo por quebrar uma solidão que se instala involuntariamente. Uma solidão que se instala na solidão dele, a solidão que ele tanto ama.

Por isso é que sempre foste o quadro principal. Nunca entendeu o Amor e nunca entendeu o porquê de dissecar o Amor. Nunca te conseguiu questionar o porque de isso te ser tao importante, de lhe sentires a ausencia e a distancia e a indiferença só porque, para ele, o Amor é algo diferente. Sente quando sente. Quando o vento lhe beija a face, quando uma esquina lhe dá saudades da tua mão, quando o alcool e o cigarro nao compensam a tua companhia.

Talvez por isso se tenham esgotado as palavras. Já se cansou de se tentar perceber para te explicar o que é ele. Ele é ele. E o Amor dele é a imagem de como existe no mund. Por isso é que sempre o inspiraste e ele nunca pintou nada exactamente sobre ti. Nunca entendeu o Amor, nunca o quis entender. Ama-te como te ama. Sente-te a falta quando lhe fazes falta. Ama-te por nunca conseguir desenhar a beleza que a tua essência tem para ele. Porque nunca compreendeu o amor, ama-te. Talvez, talvez por isso, devesses compreender que tambem nao entendes o Amor.

Talvez por isso te consoles na Arte. É quando o descobres. É quando te descobres. É o que tem em comum. Esse apego estranho à arte.

Tuesday, April 12, 2011

Amizade

O mundo é um lugar curioso, tem uns ironicos contrastes. Ser melhor que esta realidade claustrofobica e circundante é quase tao dificil quanto é viver. E já me tinha esquecido da sensação que é a consciência bruta de quando o vento murmura, fria e violentamente, que viver implica mais que ir existindo de mansinho. É mais do que ir tendo picos de uma excêntrica felicidade e momentos de entrega à profunda e azul tristeza. Tinha-me esquecido que concordo contigo. Esqueci-me das marcas que tinha por não ser igual não sendo, abertamente, diferente. A minha igualdade deixou-me ir existindo e deixou-me, em momentos conscientes sóbrios, um sabor àspero na boca. Tornou a morte e a brutalidade que a resistência a uma igualdade barata, inutil que cicatrizam no espirito, um mísero e suportavel sofrimento. O mundo é um lugar curioso, tem uns ironicos contrastes. Ser melhor que esta realidade claustrofobica e circundante , é algo que fazes tao naturalmente como se fosse fácil. O que fizeste com o teu passado define o brilhante angulo do teu sorriso. E tens essa despreocupada forma de viver relaxa e responsavelmente. Tens essa intrinseca vontade de viver. E tens essa resistencia inata de quem crê honestamente no que faz. Por isso é que vives tao forte e honestamente como se fosse fácil.E já me tinha esquecido da aromática sensação que é de quando o vento nos beija o rosto e arrefece o espirito. Porque o que fui não limita o que serei, apenas queima algumas realidades paralelas que não se habtituariam ao meu ego. Já me tinha esquecido desse sublime prazer que é resistir. O mundo é um lugar elástico, tem a forma que impuseres que tenha. Porque quando se é livre, é se inteiramente original. E já me tinha esquecido do prazer que é defender o ideal e , quase idolatrar, estas cicatrizes que moram em quem discorda. Ate te encontrar e ver a forma despreocupada e natural com que lidas com a tua marca. É tua, define-te. Mas jamais te limita. E lembrei-me que existia de mansinho em vez de viver enquanto tu eras tu. Apenas tu. Melhor que toda esta circundante claustrofobica, banal e patetica realidade.