Wednesday, February 25, 2009

Carta do Solitário

O mundo tem culpa, aliás é ele o verdadeiro responsável. Não que importe, acabou, que mais posso eu fazer? Nem tu podes alterar coisa alguma.
Um dia voltarei a ver o teu sorriso , aberto e simples. Não será perto de mim para o sentir como dantes. Estará lá apenas a minha sombra para contemplar a tua grandeza modesta, para garantir que o amor terminou. E um dia talvez até te esqueças de mim, como o vento que nunca se acomoda num lugar especifico, tudo o que te quero é felicidade. Como o coração é o de Orfeu, desdenhei a Eurídice para a não ver morrer.
Mas nunca eu me vou esquecer de ti, do teu perfume, do teu passo leve. Permaneces aqui comigo, sempre. A tua memória tão suave e fresca magoa-me porque a perdi.
Perdi. E não ha nada a fazer. Nada tenho a perder, tudo o que me importava partiu com o vento. Acabou e esgotei a minha última lágrima inutilmente porque não ta dei.

Monday, February 23, 2009

O Erro

Antigamente, a consciência de errar era dura, saber que se falhou algures. O desejo concentrava-se todo na fuga ao erro.
Mas agora não. O erro é o teu maior sonho, trocarias tudo por esse erro teu, tão pouco tu, tão pouco Ricardo Reis ou mesmo Alberto Caeiro. Falharias, fracassarias, entregarias tudo, todos os pedaços de pele a esse desejo; procurarias o suicídio, exporias as cicatrizes feias, entregar-te-ias à miséria e às lágrimas cavadas só para poderes concretizá-lo indefinidamente. Não é possível, a segurança provoca-te o sorrir mas é vazio. É tudo vazio. Estás vazio.
Sonhas à noite, o pesadelo surge quando não falhas. Queres errar, queres estar perto de novo, fazer a loucura que põe em causa toda a tua existência. Mas até esse sofrimento te proíbem.

Saturday, February 21, 2009

Drugs don´t work

Sei que vou voltar a ver o teu rosto, perdido entre outros tantos na multidão. Sei que estarás lá, algures. Mas o cansaço de fugir e de fingir anula-me e não sei se o meu verdadeiro eu te encontra assim tão diferente, tão único e belo. Não sei se não foi tudo ilusão do momento, de uma hipótese que imaginei que tinha. A corrupção interior existe em mim, assim como o amor à guerra, à vitoria, à violência. Não são compatíveis contigo . Não sei se consigo forçar a coexistência de algo tão antagónico.
Devolveram-me a tristeza alegre, o riso quase simples e puro. O eterno nó na garganta, a consciência da dor que nunca morre. E eu sou isso. Só isso.
Sei que vou voltar a ver o teu rosto e sei que vai doer, o paraíso queimado, o amor sujo, o sangue que derrama de ferida nenhuma. Mas é uma questão de habito, talvez nem nunca tenhas estado perto. Talvez nem nunca tenhas verdadeiramente existido.
Mas vai doer, as drogas vão falhar e vou ter consciência total da dor. Sei que vou voltar a ver o teu rosto outra vez.

Drugs don´t work, The Verve

Wednesday, February 18, 2009

À tua Memória

Só o mar percebe o ardor da tua memoria, a lágrima que não tem o direito de deslizar pelo espírito. Só o mar, quando na sua tristeza violenta arranca rocha e engole areia é capaz de justificar a tua ausência ( há algo em mim que lhe pertence.)
É um pensamento que anula o sorriso intrínseco e verdadeiro. A tua perda para que a guerra não se aproxime de ti, a guerra que trago nos mais leves movimentos que não faço; como se estivesse enraizado num coração algures o amor ao sangue e à violência.
Mas não, não é verdade. O mar é azul pacifico, puro e triste. E parte de mim está lá, na praia onde marquei as rochas com o meu sangue. Só o mar compreende a tua ausência, é o único sítio onde verdadeiramente fazes falta, o único onde deixaste a tua marca doce e leve, onde amansaste a raiva...
Eu não escolhi a guerra. Mas a minha vida foi consumida por uma razão de existir que é , em tudo, bélica. Eu não escolhi e não tenho opção.
Só o mar percebe a dor da tua memória, reflectida no azul dourado que aquece o coração e o dia. Mas nunca te substitui e é tudo o que tenho no final do dia. A tua memoria reflectida nas ondas do mar passivas e divinas.

Sunday, February 15, 2009

Angel

Lembro-me vagamente dos meus dias balançarem entre o feliz e o triste, o bom e o mau. Um arrastar de sorrisos e lágrimas fluido e profundo. Lembro-me de chegares e tentares tirar-me daqui, deste sitio cheio de pecados em nome da moral .De tentares desesperadamente salvar-me, enrolando-me nas tuas asas tristes cheias de amor.
Peço-te, anjo, tira-me deste lugar. Eu sei, pertenço aqui, a este sitio; nasci neste solo pertenço-lhe. E sei que partirás, um dia nunca mais estarás aqui. Mas talvez me possas levar para longe, pelo menos por agora. A dor preenche-me com vazio, com a ausência de uma verdadeira razão de existir.
Anjo, protege-me deste mundo de pecados estranhos aos meus. Anjo, enrola-me nas tuas asas tristes cheias de compreensão. Anjo, poderás libertar-me?
Angel, Judas Priest

Saturday, February 07, 2009

The Unforgiven III

Mesmo que chovesse insistentemente nada é maior que a dor dele. No único ponto de existência em que não podia falhar quase se matou ( provavelmente nunca verás a ruína em que se deixou ficar). Mas apesar de tudo, não se arrepende, faria tudo de novo, talvez ainda mais intensamente.
Curaste-lhe feridas, talvez nem nunca saibas o bem que lhe fizeste, a terapia em que te tornaste. Mas , por favor, repara: verdadeiramente, ele não tem casa e a sua vida é uma história triste mas a tua não é igual a dele. E ele não vai deixar que se torne, jamais é capaz de te sacrificar.
A chuva quase parte os vidros, arruína portas; o vento assassina árvores. Mas nada disto se compara à tortura dele. Mudaste-lhe a vida, deste-lhe a mão mas ele não foi feito para ter tanta sensibilidade ao primeiro toque. Tornou-se frio com as guerras inúteis que travou.
Não se consegue perdoar. Sabe que errou e sabe que o futuro breve não é brilhante. Mas não e isso que verdadeiramente o incomoda, que o massacra ferozmente: perdeu-te e procurar-te seria a sentença dele; e ele não pode morrer , não agora.
Não se consegue perdoar. Se pudesse, acredita, escolher-te-ia, mas não é opção dele.
Não se consegue perdoar.
“How can I be lost if I got nowere to go?
And how can I blame you when it’s me I can’t forgive?”

Friday, February 06, 2009

Resposta

Talvez um dia chegues verdadeiramente a mim e me toques, sintas que , afinal, sou igual. Quando morrer alguém tomará o meu lugar e tudo o que fui afundar-se-á numa paz cruel.
Depois de tanto esforço e investimento, compreendo parte da tua frustração. Sou o inverso do génio, do artista e de tudo o que engloba o bem. Quebro o sonho , desfaço a ideologia. Defino-me como uma criação perfeita que saiu completamente torta e desengonçada.
Tenho coração, sinto, falho porque não resisto á hipótese de não estar eternamente só no mundo que não me pertence. Erro porque, em certos reflexos solares, tenho um lugar no mundo e tratam-me como gente.
Eu sou igual aos outros ; diferente do que já fui. Vê, não sou a mesma pessoa. Quero outra coisa da vida, procuro incessantemente o meu coração. Não é visível?
Basta isso para fazer toda a diferença.

Thursday, February 05, 2009

These are the days

A filosofia baseia-se num bom individualismo, num egoísmo altruísta. É olhares-te e teres-te como melhor amigo, uma sombra fiel que nunca te abandona, que te segura e , sobretudo, que te protege . No fundo, a filosofia consiste em amares-te indefinidamente, mas sem cariz amoroso ( se não o lago era o teu cemitério).
Caracteriza-te e define-te no teu pormenor mais solitário, coloca toda a intensidade do teu ser na boa acção que o mundo , sedento de actos em grande e caridosos, nunca verá. Procura o anonimato para encontrares o conforto de seres ninguém e, por isso mesmo, seres carinhosamente livre . Esquecendo os outros e as suas lutas em busca da felicidade vazia, vives de acordo contigo próprio, coerente com a tua própria ideologia (que é nenhuma).
O mundo não existe, os outros não existem. O segredo da filosofia é um egocentrismo afável e controlado, porque se morreres, não há mais nada.
These are the days, Jamie Cullum

Wednesday, February 04, 2009

Ausência

Sou eu, bem o sei. Depende tudo de mim, do meu nervo que falha porque não é azul, eternamente azul como o teu. Destino-me a múltiplos fracassos em busca de uma vitoria verdadeiramente conquistada. Qual o sentido de tomar banho sem antes dormir noites de frio aconchegado na lama?
Mas enquanto estiveste aqui eu fui suficientemente importante para não me deixar fracassar na quebra da monotonia de uma existência. Foste o meu objectivo, o meu desejo de melhorar qualquer coisa. Uma amnésia agradável porque so apaga as mas memorias, mais uma cegueira consentida do que um esquecimento .
E foste, a par de tudo isso, a única impossibilidade que tenho, o teu nervo azul não esta perto do meu ( continuamente feio). Um dia acordei e já não estavas aqui, e o meu dia foi igual aos outros. Na verdade, nunca exististe.

Tuesday, February 03, 2009

Dumb

Passamos infinitos segundos a fingir qualquer coisa. A querer qualquer coisa que nos parece eternamente inacessível; entre uma estranha burrice e uma felicidade quase vazia perdemo-nos entre o que somos, o que deveríamos ser e o que os outros querem que sejamos.
Compomos o mundo com sons, entregamos o coração a algo que reflicta os nossos pormenores artísticos e sensíveis. A fragilidade implícita no nosso sorriso , corrompido pela dureza oriunda de feridas profundas e batalhas ainda não travadas, não nos denuncia e os outros não nos vêem verdadeiramente. É o esconderijo perfeito, a magnificiencia da ilusão.
É uma burrice esquisita ou uma felicidade que não é suficiente. Mas não desistas. E agarra-me, para não cair eternamente na minha oportunidade de ser como eles.

Dumb, Nirvana

Monday, February 02, 2009

Veneno Doce

É um veneno que carrega a leve felicidade, uma droga doce. É impossível não hesitar, não trair o juramento, não ofender o sangue. Sobretudo pela questão da curiosidade, experimentar algo novo. Deixar que a droga se apodere do corpo e torne a mente mais translúcida.
É um veneno com um cheiro agradável, uma infinidade de portas para mundos novos , cada qual mais belo e mais útil que outro; cada um mais perfeito e mais único, especial e pormenorizado .
Mas é uma droga. O dia – a-dia de outro qualquer transeunte (mesmo do individuo mais singular) corta-te asas, sacrifica-te pele. O cheiro perfuma o espírito e qualquer porta poderia esconder um mundo só teu. Mas como não foi esta a tua verdadeira escolha, não tens direito . Nem sequer de gostar.
É um veneno. Ou desistes da ilusão de ser como eles num jeito de curiosidade existencial, ou morres afundado na incapacidade de te reconheceres no lago.