Saturday, September 30, 2006

Meio-Dia

Meio-Dia. Um canto da praia sem ninguem.
O Sol no alto, fundo, eneorme, aberto,
Tornou o céu de todo o deus deserto.
A luz cai implacáel como um castigo
Não há fantasmas nem almas,
E o mar imenso solitário, antigo
Parece bater palmas.

Sophia de Mello Breyner Andresen


Wednesday, September 27, 2006

Será a beleza efémera?

O que é uma coisa bela?Que fazer perante uma coisa bela?Tantas perguntas...
Julgo que , uma coisa bela, é uma coisa com um significado especial para nós; algo que encaixa perfeitamente. E acho que um encaixamento perfeito nunca deve ser esquecido. Deve antes, ser interiorizado e sentido.
Sim, sobretudo deve ser sentido, porque admirar algo belo não é, necessariamente, ser-se fútil ou superficial.Não. Fazer a coisa mais estúpida e banal do mundo com sentimento , fazendo-a sendo nós próprios , é fazer algo novo.Algo profundo.Algo belo.
Não importa se ficamos a observar um quadro , uma pessoa ou o que quer que seja só porque consideramos que é belo.Não importa desde que nos cause sensações.Que nos ilucide.
Não considero a beleza algo efémero. Do mesmo modo que a inteligência pode ser imortalizada, também pode a beleza.É uma questão de perspectiva.Basta repararmos nas coisas simples: a noite estrelada; uma manhã fria e cheia de sol; a tristeza melancólica de uma folha a cair no Outono.Tantos quadros famosos que estão repletos de beleza!E repare-se, alguns destes quadros têm séculos.
A única coisa efémera somos nós.A ignorância é eterna.

Tuesday, September 26, 2006

Solidão

"Em um mundo em que a vida se une tanto à vida (...) Em que o cisne conhece todos os cisnes, só os homens constroem a solidão"

Antoine Saint- Exupéry



Monday, September 25, 2006

Morte


Sentado na velha cadeira, olhava o mundo que ultrapassava as suas grades sem interesse , curiosidade ou mesmo esperança. Apesar do rosto ser jovem , o espírito era envelhecido e cheio de rugas , como um idoso. Não era capaz de identificar a altura em que tinha ficado velho e rugoso; tudo o que era capaz de lembrar era a sua desistência pela vida.
A cadeira balançou e chiou e ele próprio deixou escapar uma emoção ao ver um grupo de amigos ás gargalhadas. Recordou-se lentamente de quando era assim jovial, feliz, risonho, um pouco inconsciente …
Relembrou depois, muito convictamente, a sua vida com os avós (vivera com os avós porque os pais tinham morrido num acidente de carro por culpa de um bêbado qualquer), da morte do avô , da ida da avó para um lar e da rapariga que o abandonou por um norueguês; de como tinha perdido a confiança nos outros seres humanos e de como isso dera cabe de si.
Suspirou .E o seu suspiro foi tudo o que foi humano na figura jazida na cadeira de baloiço.
Perdera tudo… perdera a imaginação, a esperança, os seus ideais e as suas metas…até a capacidade de amar - o próximo ou a ele próprio.
Apesar da sua vida inteira ter sido um quadro cinzento, a grande culpa da morte era sua. O facto de não ter tido capacidade de sorrir quando tudo merecia uma lágrima fazia dele um suicida.
Que era feito do seu desespero? Já nem isso sentia… mas não estava perante o fim…estava perante o princípio do fim... não, já não era humano (há quanto tempo já não o era?)
Num impulso lamentou não ter lutado, não ter tentado sobreviver aos obstáculos da vida; lamentou não ter pintado a vida de azul…
Suspirou outra vez e deixou, de novo, o corpo cair na cadeira. Fechou os olhos e já nem o barulho que os jovens faziam lá fora o intimidava.Estava (agora tinha a certeza que estava)definitivamente morto, com os olhos encerrados para as pessoas, para o mundo e para si próprio. Tudo o que agora existia eram as grades feitas do vazio da sua alma.
Novembro 2005

Sunday, September 24, 2006

Momento de Poesia

Agora que o silêncio é um mar sem ondas
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

Miguel Torga

Saturday, September 23, 2006

O nascimento de Ícaro

Um dia disseram-me :" gostas tanto de escrever, porque não fazes um blog"?E eu respondi: "não, não tenho nada para dizer." Não se pode dizer que menti.Mas é uma mentira dizer que disse a verdade.Foi uma resposta indefinida, perdida no meio do nada, muito pior que uma mentira.
A verdade é que não queria um blog com medo que alguem descodificasse a minha essência.Receava , acima de tudo, que um perfeito desconhecido desocbrisse sentimentos meus.Ou pior, que um desconhecido descobrisse em mim coisas que eu recalcava, que não queria redescobrir.
Mas, por um feliz acaso, decidi (re)ler O retrato de Dorian Grey de Oscar Wilde.Com essa obra apercebi-me de que esocnder algo sobre nós obessessivamente num quadro,num texto ou num simples gesto, é revelar a única coisas que nunca se demonstra: o medo.Esconder é revelar.
Deste modo, o livro mudou-me a perspectiva, alargou-a.Foi como se uma janela trancada se abrisse , mostrando-me a capacidade de autonomia ali à mão.
Ler aquile livro foi uma necessidade de sobreviver à rotina.Foi descobrir a cor suave do mar no túnel escuro e sujo. Ou apenas deixar-me influenciar por um livro.