É uma leve injustiça cujo trago já conheces há tanto tempo
que te não rouba qualquer bem-estar. Há uma vaidade existencial equilibrada que
te vai orientando, nunca teus olhos procuram o que se esconde debaixo da terra,
sabes bem que teu coração pertence ao mar. É uma leve injustiça, sorris, já há
habito – e já foi pior. Uma pequena represália do tempo que é teu contemporâneo,
é uma pequena injustiça, à qual sobrevives, que outra hipótese tens? Teus
ouvidos seguem docemente o azul, esperas o juízo final, tens contas nenhumas a
ajustar, foste homem enquanto o soubeste ser, a forma como aceitas o castigo
consiste na não-punição.
E que importa o mundo e as suas mesquinhices e os seus
assuntos aborrecidos? Teu coração pertence ao mar, teus ouvidos seguem o azul, teu
pensamento procura a disciplina para que teu ser possa gozar com fartura não
ser mais corpo opaco ao sabor de uma corrente qualquer. Fechas os olhos e vês melhor, apagas a luz
para que a verdadeira luz irrompa do vazio, sentes-te no mundo , garantes um
lugar à força de existires tranquilamente contigo. Até sabes porque é
complicada a tua razão para com o mundo, até sabes quais são as queixas, mas
que importa? Sorris e reafirmas – és
feliz enquanto o mar te guardar o coração com ternura, enquanto o azul te
iluminar o caminho. Tudo resto é irrelevante – é uma grande justiça que trazes
contigo, quando manténs uma honesta espinha que jamais se dobra. Não está à
venda o ser que é teu – e isso é justiça.
“Porque tu vais de mãos
dadas com os perigos, e eles vão à sombra dos abirgos, Porque eles calculam mas
tu não.”
Inspirado em Porque
de Sophia de Mello Breyner.
2 comments:
"Tudo resto é irrelevante – é uma grande justiça que trazes contigo, quando manténs uma honesta espinha que jamais se dobra."
Uma frase que resume bem o teor da frase de Sophia. Gosto de acreditar que ela se referia a toda essa gente que se vende por qualquer coisa - um emprego mais estável, a boa cara do chefe,a certeza deum lugar de estacionamento. Porque vendo bem as coisas, quase toda esta gente apaga "quem" é. E com isso apagam tudo.
Porque os outros são tumulos caiados, onde germina calada a podridão (...) mas tu não.
Gosto muito deste poema. Julgo que dá um lugar no mundo aos desfasados. A alguns desfasados. Até porque julgo que ela foi um deles.
Resistir é uma arte.
Obrigado!
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